24.3.03

Marte


Marcelo Benvenutti

Depois da vida em Marte, o que me resta?
Resta uma cama solta num quarto escuro.
Um dia amanhecendo triste e vazio.
Resta a quase certeza da solidão.
Resta saber que ainda sobrevive a incompreensão.
Não estou alegre ou triste.
Aditivos químicos comandam as vidas alheias
que se deslumbram com o canto das sereias.
Mas quem sou eu perdido nessa viagem?
Um imbecil sensível que se apaixona e
se atira de cabeça. Sem pensar. Sem temer.
E o que há para se temer? Nada.
Estamos mortos desde o dia em que nascemos.
Cada dia é apenas um caminho a menos para o fim.
Ainda resiste algo. Eterno. O amor sem medo.
O temor morre na finitude dos covardes.
Prefiro a intensidade do momento.
A veracidade da loucura momentânea.
O relacionamento que se expande na liberdade alheia.
Não existe a dor psicológica ou a tristeza de apartamento.
A rotina é a forca dos sentimentos.
Quero a rotina insana da paixão sem perguntas.
Quero viajar e não temer as respostas que não sei responder.
Não tenho respostas para tudo.
Quero a irresponsabilidade da vida fiel.
Sento na cadeira cansado de tanto esperar a verdade.
A verdade é como queijo derretido.
Se não for consumida na hora, fica seca e dura.
Mas o desejo e a paixão? Essas doenças que atacam os bons
de coração? Aonde sobrevivem?
Em algum lugar de Marte, onde nunca estive.
Quando lá chegar saberei que é verdade
e que encontrei o amor verdadeiro.
Sofro? Sim. Claro que sim.
Até as pedras choram.
Eu não sou uma pedra.
Sou um marciano.

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